O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), disse, em entrevista ao Estadão/Broadcast, que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), recentemente denunciado sob acusação de liderar uma tentativa de golpe de Estado, terá dificuldades para disputar a eleição de 2026.
Ele ressalvou, porém, que “muita coisa pode mudar” até lá.
Mendes afirmou que talvez nem o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), dispute a reeleição.
Lula vive um momento de baixa popularidade e terá 80 anos na data do próximo pleito.
O político também afirmou que há tensionamento demais em torno dos processos sobre os ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro de 2023.
Segundo ele, isso não vai terminar bem. O governador também declarou que estão sendo aplicadas penas desproporcionais a pessoas que participaram do episódio.
Mendes disse que o governo federal não está empenhado em destravar a obra da Ferrogrão, ferrovia projetada para escoar a produção agrícola de Mato Grosso e região.
O governador também mencionou o imbróglio sobre as pesquisas por petróleo na Margem Equatorial, próxima à foz do rio Amazonas, como exemplo de que o presidente da República tem pouco comando da área ambiental.
O governador de Mato Grosso disse, ainda, que é engano achar que a disputa comercial entre Estados Unidos e China beneficiará o Brasil.
Ele cita a possibilidade de o governo de Donald Trump estar tensionando a relação com a potência asiática para aumentar a presença de produtos americanos no mercado chinês.
Isso poderia prejudicar o Brasil, de acordo com esse raciocínio, porque os EUA também têm grande produção agrícola e poderiam tomar espaços de produtos brasileiros no mercado da China.
Mendes defendeu que a próxima eleição não seja focada em nomes, mas que discuta os principais problemas do País.
Citou como exemplo a escolha dos governantes na China, que seria por meritocracia.
O país, que nas últimas décadas se tornou uma potência econômica, vive sob uma ditadura comandada pelo Partido Comunista desde o fim da década de 1940 e não tem voto direto para escolher presidente e governadores.
Mauro Mendes tem 60 anos e está em seu segundo mandato como governador de Mato Grosso.
Antes, ele foi prefeito de Cuiabá.
Também é engenheiro, empresário do ramo de estruturas metálicas e foi presidente da Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso (Fiemt).
u acredito que não. Esse passo foi dado, a construção foi aprovada, a regulamentação, então agora é a hora de implementar aquelas alterações. Existe um foco de interesse muito grande nesse comitê gestor e ele não é, do meu ponto de vista, o ponto mais delicado da reforma. Temos outros pontos e o principal deles, na minha opinião, são as consequências dessa reforma a partir de 2033, quando nós vamos desonerar completamente toda cadeia de exportação. Já vamos sair com o IVA mais caro do mundo. Se nós estamos desonerando, deixando de pagar grandes setores, alguém vai ter que pagar mais quando esse imposto estiver vigorando.
O senhor é de um Estado que tem uma classe produtiva que vai ser beneficiada por essa desoneração relacionada à agropecuária, na exportação. Acha que foi exagerado esse benefício?
O agronegócio é muito relevante em todo o País pela competência e capacidade, é muito exportador. Nas exportações, nós teremos toda a cadeia isenta. Se toda a cadeia é isenta e nós temos uma forte presença dessa entidade econômica no meu Estado, nós somos um dos Estados que mais teremos perdas. Existe um fundo de compensação que não compensa 100% e tira do Estado. É uma preocupação para nós, mas eu vejo que deveria ser uma preocupação para todos os brasileiros. Não é só o Mato Grosso que tem muita exportação, outros Estados também têm. O próprio governo federal vai ter uma perda de receita e está apostando muito no crescimento dessa economia. Com tantos problemas que o Brasil coleciona, eu não sei se isso vai acontecer.
Com a entrada de Donald Trump no governo dos Estados Unidos, essa guerra querendo taxar todos os produtos, como o senhor vê o cenário aqui a médio prazo?
A médio prazo, o Trump não estará mais, porque são apenas quatro anos e ele não pode, pela Constituição americana, ir para uma reeleição. O Trump chegou, ligou a metralhadora, mas ao final ele vai negociar. É ledo engano nós acharmos que essa briga, entre aspas, dos Estados Unidos com a China possa ser boa para o Brasil, para nossas exportações. A China precisa muito dos Estados Unidos, os Estados Unidos precisam muito da China, existe uma simbiose dessas economias. Uma sem a outra, todos terão grande prejuízo. Não consigo enxergar eles brigando e os dois perdendo com isso. O Brasil pode ser mais uma vez perdedor, porque o problema dos Estados Unidos com a China é que há um déficit comercial gigantesco, favorável para os chineses contra a economia americana. Eles podem, nessa negociação, exigir um pouco mais de contrapartida dos chineses e aí a compra de commodities alimentares, que os Estados Unidos também são um grande produtor do agronegócio, pode vir em desfavor dos interesses de todos nós brasileiros.
O senhor mencionou que é prejudicial ao Mato Grosso essa isenção ao agronegócio e à cadeia de exportação, porque o fundo não vai ser suficiente para compensar tudo. O senhor acredita que o agronegócio teria condição de absorver o imposto sem esse benefício?
O exportador, na hora da exportação, ele não paga o ICMS. Entretanto, o óleo diesel que se usa em todo o agronegócio mato-grossense brasileiro paga ICMS. O pneu que ele compra paga ICMS. As peças de reposição pagam ICMS. Existe uma contribuição de toda a cadeia na qual o agronegócio brasileiro e mato-grossense está inserido, com os impostos que fazem frente aos serviços públicos que nós prestamos. Como é que nós vamos pagar o salário do policial, dos médicos, dos professores? A máquina pública brasileira não vai diminuir o seu custo em função dessa reforma. Aliás, a máquina pública brasileira cada dia custa mais. Isso vai quebrar o País em algum momento.
Governador, os Estados estão avaliando o texto do programa para Estados endividados, o Propag, para eles colocarem as contas em dia. O programa beneficia os superendividados, mas também tem o fundo de equalização, destinado principalmente aos menos endividados. Mas este fundo só vai ser viável se todos os Estados participarem, e aí a reclamação dos mais endividados. O senhor acredita em um acordo em torno deste fundo? Acredita que vai haver um desestímulo a manter as contas em dia? Como é que está esse acordo entre os governadores?
É um assunto delicado. Foi publicado num grande veículo nacional a lista do endividamento de todos os Estados brasileiros. Mato Grosso apareceu em último lugar com a menor dívida líquida, aliás, apareceu com saldo positivo. Não é justo. Quando vem premiar esses superendividados, os que fizeram a lição de casa têm o direito de reclamar, sim. Precisamos ter um tratamento, porque, se não, é um prêmio à ineficiência, à condução de forma irresponsável. Não estou acusando governadores atuais, porque isso é uma herança de muitos anos, às vezes de muitas décadas.
O governo do presidente Lula está prestes a apresentar uma proposta de emenda à Constituição que aumenta a participação da União na área de segurança pública. Vários governadores demonstraram insatisfação com essa discussão, porque, segundo essa linha de raciocínio, essa proposta invadiria a competência dos Estados. O governo apresentou uma versão nova, dizendo que esse risco estaria muito minimizado. Não tem mesmo chance de invasão de competência? Acredita que esse projeto vai ser aprovado?
O crime é organizado. Enquanto isso, o Estado não se entende, o governo federal não tem uma política clara, objetiva. O Código Penal Brasileiro é de 1940, com alguns remendos. Temos hoje instrumentos frágeis. Criou-se no Brasil uma sensação de impunidade. É lamentável isso. Nessa PEC, para mim, não vi nada de novo que vai mudar isso. É sopa de letrinha, mudanças que não vão no coração do problema, que é essa sensação de impunidade. Essa PEC não vai trazer nada de novo para melhorar a segurança pública.
Por onde o sem hor acha que deveria ir essa discussão?
Essa discussão tem que passar, na minha opinião, por uma reformulação completa do nosso sistema penitenciário, passar por uma reforma completa da legislação, nós temos que desestruturar a cadeia do crime, o bandido tem que voltar a ter medo do Estado, medo da pena. O Estado brasileiro foi muito incompetente para estruturar um sistema penitenciário decente. As facções criminosas nasceram dentro do sistema penitenciário, se fortaleceram lá. Temos que reestruturar essa legislação, as pessoas precisam ter medo da pena. O medo e o respeito são dois sentimentos que o ser humano precisa ter e preservar. Os bandidos jamais tiveram respeito e perderam completamente o medo. Temos que ter penas duras e um sistema penitenciário que funcione. No nosso Mato Grosso, zerou o déficit penitenciário.
O senhor vê empenho do governo federal para destravar a Ferrogrão?
Lamentável, mas eu não vejo. Eu estive com o ministro Rui Costa quando eles estavam definindo o chamado PAC e eles pediram para que o governo indicasse quatro obras prioritárias. E eles não iam colocar a Ferrogrão. Eu pedi, pelo amor de Deus, não faça isso, será um tiro no pé. Depois de alguns debates internos, parece que a área ambiental do governo era contra, colocaram [a Ferrogrão no PAC]. Mas de lá para cá, pouca coisa andou. Nós já estamos começando do meio para o final deste mandato do presidente Lula e pouca coisa andou para que nós pudéssemos ter a viabilização por parte do governo federal de um leilão, de concessão, de viabilização da ferrovia. Precisamos destravar essa coisa que o Brasil é o país do ‘não pode’, não pode fazer ferrovia enquanto o mundo inteiro faz. Não pode explorar petróleo na costa marítima enquanto o mundo inteiro faz. Preservar o meio ambiente todos nós, brasileiros, queremos. Mas não ao custo da miséria.
Governador, qual seria a causa desta falta de empenho do governo Lula neste sentido?
Imagino que é a dificuldade na condução ambiental desses temas dentro do governo. Está lá o presidente Lula se batendo com a questão do petróleo na costa norte do País e até agora nada. Falta comando e controle do presidente Lula e fazer valer a sua palavra. Obras de infraestrutura importantes no País estão sendo barradas pela situação da área ambiental do governo.
Como é a sua relação hoje com o Palácio do Planalto? A distância política entre o senhor e o presidente Lula atrapalha de alguma forma o trabalho?
Tive relação respeitosa com o governo do presidente Bolsonaro, procuro ter essa relação respeitosa com o governo do presidente Lula. Se puder ajudar, eu ajudo. Nós não dependemos muito do governo federal. Aqui nós fizemos a lição de casa, não fico indo a Brasília atrás de dinheiro.
O ex-presidente Jair Bolsonaro foi denunciado pela PGR sob acusação de liderar uma tentativa de golpe. Ele está inelegível. O senhor acha que há chances de ele voltar a disputar eleições? Qual o impacto dessa denúncia no campo da direita?
Essa história do 8 de Janeiro talvez um dia seja digna de uma boa série da Netflix, tem muitas dúvidas sobre realmente o que aconteceu naquele dia. Tenho absoluta certeza que milhares e milhares deles que ali estavam são pessoas de bem e nunca tinham cometido um crime, estavam ali manifestando seus sentimentos. Uma população inflamada, basta meia dúzia no meio, quem são essa meia dúzia? Insuflou e aí aconteceu tudo aquilo que é absolutamente reprovável. Precisava de algum tipo de punição, mas acho que a pena que se está dando àquelas pessoas é desproporcional.
O senhor concorda com a avaliação do novo presidente da Câmara, Hugo Motta, de que não foi golpe o 8 de Janeiro?
Eu concordo que a maioria das pessoas que estavam ali não estavam ali para dar golpe, estavam ali para manifestar uma insatisfação. Pode até ser que alguns, sim, tinham isso como intenção, é importante separar o joio do trigo. Com relação à denúncia feita pela PGR, eu não conheço, eu não vi os detalhes. Não aprovo nenhum tipo de golpe. Acho que se isso se comprovar corretamente, de maneira muito isenta, é algo reprovável, mas temos presunção da inocência. Acho que pode estar se construindo um bom enredo para manter um espectro de atenção em cima do 8 de Janeiro, que é lamentável, mas que tem que botar um ponto final nisso. Se não, essa história vai acabar mal para o País, porque vai tensionando demais.
Especificamente com relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro, qual a sua avaliação? O senhor acha que ele tem futuro político?
Bolsonaro é hoje a maior liderança política do País, junto com o presidente Lula. Ele tem uma capacidade de arrastar multidões, o que o próprio presidente Lula não está conseguindo. A liderança política tem que ser olhada com atenção e com algum tipo de respeito. No final do dia, ela representa milhões de brasileiros que pensam parecido. Vejo que ele vai ter dificuldade para ser candidato, mas eu acredito que muita coisa pode mudar nesse cenário político até 2026.
No estado que a coisa está hoje, com o ex-presidente Bolsonaro inelegível e o presidente Lula com a popularidade em queda, o senhor vê que cenário para 2026?
Eu não quero aqui ser cartomante nem fazer exercício de futurologia, mas está muito claro para qualquer um que a esquerda tem dificuldade em ter um nome. O presidente Lula é o grande líder e talvez o único reconhecido na esquerda brasileira. Pelo lado da direita, tem muitos nomes, mas todos também muito distantes do presidente Bolsonaro, que é hoje na direita o nome que tem a maior percepção. Tem nomes de governadores, de algumas lideranças, mas esse cenário, por enquanto, vai ficar dominado por esses dois atores. Talvez nenhum dos dois seja candidato e aí nós vamos ter grandes surpresas. Pode explodir o número [de candidatos], ter briga fratricida na esquerda para ver quem será o detentor dessa prerrogativa de ter o espólio do Lula e do lado da direita a mesma coisa. Quem vai ter o espólio do Bolsonaro, caso ele não possa ser candidato? E eu espero que essa discussão em 2026 não seja em cima do nome A, B ou C, de Lula, de Bolsonaro, de qualquer outro nome, seja em cima dos graves problemas deste País.
Como o senhor ouve o nome de Ronaldo Caiado e esse emaranhado de outros nomes que têm surgido para a eleição de presidente da República em 2026, como Tarcísio de Freitas, Pablo Marçal e Gusttavo Lima?
Com todo o respeito a todos os nomes, qualquer brasileiro que esteja filiado a um partido político e em dia com a Justiça Eleitoral pode ser candidato. Os problemas são gigantescos, e nós precisamos encontrar alguém que tenha coragem, competência, estratégia e capacidade de liderar o País para não deixar que nós entremos num grave problema como aconteceu com a Argentina. Será que esses nomes que estão aí têm experiência? Seria a mesma coisa que eu chegar e falar que quero ser o técnico da seleção brasileira. Mas, Mauro, você jogou futebol? Não, nunca joguei. Veja o modelo da China. Por que a China é hoje o que é? Porque lá ela escolhe os governadores de Estados entre os melhores prefeitos da sua província. Os melhores prefeitos por desempenho, por uma metodologia clara, objetiva, de medir resultado, ela escolhe o governador. Entre os melhores governadores, eles escolhem o presidente. Só citei para dizer que se nós continuarmos olhando só para as pessoas, sem ter um critério mais claro, se o brasileiro não prestar atenção no como votar e o que está em jogo, vamos ter que amargar grandes sofrimentos para, quem sabe, um dia aprender a fazer aquilo que é correto na hora de escolher quem vai cuidar do nosso destino.
Está sendo discutida uma reforma ministerial em Brasília. O senhor acha que o União Brasil deveria continuar tendo ministros no governo Lula? E o que o senhor defende para o União Brasil fazer nos próximos dois anos em relação à política do governo federal?
Não adianta ficar em governo só para barganhar cargos e fazer algumas coisas cujos resultados nós já conhecemos bem. Eu defendo que o União Brasil seja um partido independente. Naquilo que for bom para o País, que apoie o presidente. Não podemos votar contra o País. Não fazer isso em troca de ministério, de cargo ou de qualquer outro tipo de apoio.
Então, o partido devia desembarcar do governo na Esplanada?
Essa é uma análise que, na minha opinião, é secundária. Pode até ter um cargo lá. O que não pode é trocar esses cargos por apoios ou trocar esses cargos por uma atuação que em muitos momentos não representa as melhores decisões.
Uma última pergunta, que é uma pergunta prática. Quais os seus planos para 2026?
Em 2025, vou continuar trabalhando muito, focado no meu Estado. Em 2026, eu vou decidir. Primeiro, se quero continuar na política, tenho sempre que dialogar com a minha esposa, com os meus filhos, sobre uma decisão dessas. Vou ouvir as pessoas que estão mais próximas, vou ouvir o sentimento da população do meu Estado. E aí, vou decidir se termino o meu mandato até o final de 2026, ou se eventualmente deixo ali em abril para aspirar algum cargo que vai estar disponível em 2026 para ser disputado, provavelmente senador.
O País está se preparando para colocar um novo sistema tributário em funcionamento. Um dos pontos necessários é a composição do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços. Quanto tempo o senhor acredita que vai demorar para esse comitê gestor estar funcionando?
Tem várias discussões em curso, existem alguns detalhes ali que estão sendo discutidos entre o conjunto de secretários de governo, o governo federal, os municípios. Então, é uma reunião de muitos atores, cada um olhando para o seu interesse. Isso dificulta um pouco, mas eu acredito que ao longo dos próximos meses, ainda neste ano, nós teremos que chegar a um acordo e fechar e bater o martelo nisso.
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